07 agosto 2010

O menino encantado - Parte 1

Era uma vez, um menino que tamborilava com o dedo indicador sua bola de gude antes de jogá-la no chão, e se inquietava por ela não retornar à sua mão. A vida seguia o seu curso normal, a Terra girava em torno do Sol e a Lua em torno da Terra. Somente ao menino essa normalidade não era perceptível. Também pudera, ele tinha apenas três anos. 

O menino continuou no seu mundo silente, às vezes perturbado por um canário pousado em uma árvore, observando-o ali parado, sem entender por que ele esperava a bola de gude subir por sua própria vontade. O canário de plumagem amarela entoou uma canção, lhe dizendo, menino bobo, a bola não subirá. 

Outras vezes era perturbado pelo vento, que lhe dizia, suavemente por entre as moitas, não percebeu, menino bobo, a voz do canário que eu lhe trouxe? O liame do mundo real ao mundo encantado dos pássaros e vento, o menino só perceberia muitos anos depois.

O Senhor do tempo acionou a engrenagem, girando a roda do tempo, e o menino, acometido pela espera de algo que nunca aconteceria, continuou a tamborilar com o dedo indicador a bola de gude para depois jogá-la no chão. Esperou alguns segundos e, como ela não voltava, foi buscá-la, soltando-a em seguida, amiúde. Cansado, o Senhor do tempo deixou-o cobrir o menino com o manto do envelhecimento. 

Faltavam poucos dias para o Natal quando algo incrível aconteceu. Não foi exatamente como o menino queria, mas sim como ele menos imaginava.

Das coisas que fazemos quando criança, há pelo menos uma que nos acompanha pelo resto da vida, sem disso nos darmos conta. Por mais que o Senhor do tempo tivesse acionado a engrenagem do tempo, naquela cidade o que menos se notava era a passagem do mesmo. 

Estava lá a mesma árvore onde pousou o canário que entoou a canção levada pelo vento. Estavam lá, também, o mesmo canário de penugem amarela e o mesmo vento trazendo a voz desse canário dizendo, menino bobo, a bola não subirá. 

Somente o menino não era o mesmo. Já havia completado dez anos, e ainda trazia no bolso a mesma bola de gude, agora trincada pelo manto do envelhecimento. Era um rapaz (outrora fora menino, pois é da natureza o menino primeiro virar rapaz para depois virar homem), no entanto, mantinha-se, em seu interior, criança.

Ele soltou a bola de gude, esperou alguns segundos para que ela retornasse por vontade própria e, como não retornou, repetiu a mesma ação. Nunca deixou de ser menino, por isso, nunca deixou de ser feliz.

Rapaz bobo, não está me vendo? Quando ele ouviu essa voz, vinda não sabia de onde, meneou a cabeça procurando na mesma direção por sua bola. Não achou nem uma nem outra. Ao olhar para cima, o halo do sol no centro do céu cegou-o por uns instantes. Abaixando os olhos teve a impressão de ouvir uma formiga repetir: rapaz bobo, não está me vendo?

Continua...

3 comentários:

  1. Que belo e encantando conto...
    Bjs.

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  2. Oiê,

    Engrenagens do tempo... quem pode parar?
    Mas por dentro, ninguém envelhece, não é mesmo?

    Abraços e boa semana :)

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  3. Tem sonhos que permanecem em nosso coração. Vamos aguardar a continuidade desse lindo conto.
    beijos

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