Pedro desde os três anos morava na rua. Hoje, aos sete anos, passava fome e frio, mas nunca perdera a fé em Cristo. Dezembro chegou e ele não entendia o porquê das luzes de Natal estarem armadas e acesas nas ruas. Provavelmente o espírito de Natal está mais ligado ao comércio do que à família, apenas remotamente inspirado no nascimento de Cristo. Família, aliás, sempre fora o seu único pedido em seus parcos Natais, e o presente que Papai Noel nunca lhe trouxe. De alguma forma ele mantinha a esperança, pois por mais pobre que fosse, sem fé ele seria um miserável. Com certeza Cristo estava preparando um lar para ele, e viria pelas mãos de Papai Noel.
Quantas vezes ele esteve perto de ter um lar, mas sempre era rejeitado para adoção por ser negro. Em sua cabeça de criança essa divisão de raças nunca fizera sentido, pois ele era, como todas as outras crianças que conhecia, da raça humana, a única que para ele existia. Para não se desumanizar, em um dia de coragem e tristeza imensos, ele havia fugido do orfanato.
Parado diante daquela loja que vendia eletrodomésticos à prestação para o Natal, assistindo aos televisores ligados, ele percebia o porquê de ser rejeitado: todos na tela eram brancos, ricos e belos. Se porventura houvesse um negro, necessariamente a ele correspondia uma das três funções a ele permitidas: ou era escravo, empregado desqualificado, ou, ainda pior, bandido. E pensar que a raça é humana apesar das matizes. Com uma imagem desta quem adotaria uma criança de cor? As lágrimas vieram ao rosto. Saindo dali Pedro sentou-se em um banco na praça admirando as luzes de Natal e com esperança no coração desejou, mais uma vez, que Papai Noel lhe desse uma família.
Antevéspera de Natal.
Não muito distante da praça em que Pedro dormia, pai e filho discutiam em um apartamento de luxo. O pai, de nome Isaias, não compreendia a frieza do filho que tão cedo perdera a ilusão e desprezava a figura de Papai Noel. Isaias, entristecido, lembrava de que quando criança colocava o bilhete no pé de meia pedindo um presente a Papai Noel; ele fez isso até os dez anos, e sempre os presentes estavam debaixo da árvore de Natal.
Paulo, o filho, com oito anos não mais aceitava aquele ritual, ele sabia que era o próprio pai quem presenteava e não Papai Noel, então para que continuar com a farsa? Quando Isaias ouviu a palavra farsa saindo da boca do seu filho entristeceu-se de vez e, sem Paulo saber, juntou todos os seus brinquedos recebidos no Natal e colocou-os em um saco. Dirigiu-se para a praça mais próxima e a primeira criança que ele viu foi Pedro, dormindo. Deixou o saco com os brinquedos perto dele, e em lágrimas subiu para o seu apartamento.
Na manhã seguinte...
Paulo desceu com a babá para jogar bola na praça, quando viu Pedro brincando com um dos seus brinquedos. Paulo perguntou a Pedro de quem ele os recebeu e Pedro respondeu que fora Papai Noel. Seguiu explicando, com a lógica das crianças que nunca desistem de seus sonhos, que Papai Noel lhe confiou tantos brinquedos porque esses deveriam ser de crianças que não obedeceram aos seus pais. Paulo perguntou onde ele morava e Pedro respondeu que morava ali na praça, pois não tinha pais. Pedro perguntou qual o presente que Paulo havia pedido ao Papai Noel, e este lhe respondeu que não ganharia nenhum, pois não havia pedido. Pedro, feliz por poder fazer feliz a um menino no dia de Natal, deu todos os presentes para Paulo, explicando-lhe que ele não teria onde guardá-los. Paulo perguntou se ele não ficaria chateado em não ficar com nenhum brinquedo, a que Pedro respondeu não, pois Papai Noel aquela noite lhe daria seu presente. Curioso, Paulo perguntou-lhe qual era e essa foi a resposta:
- Uma família,é claro! Você acredita que ele existe?
Neste momento, chegando mais perto depois de presenciar toda a cena, o pai de Paulo reforçou a pergunta:
- Você acredita filho?
Em lágrimas Paulo respondeu que sim. Pedro perguntou se ele tinha escrito a cartinha e colocado no pé de meia para Papai Noel. Paulo respondeu que não. Pegando-o pela mão, Pedro lhe disse que estava na hora de escrever, pois no dia seguinte seria noite de Natal. Como ali não tinha papel e caneta, todos subiram para o apartamento e lá Paulo e Pedro escreveram no papel o presente que eles queriam ganhar e colocaram no pé de meia e penduraram na janela. Os dois olharam para o céu como procurando o trenó; não viram, mas havia uma estrela com um brilho maior e eles a fitaram com esperança que seus sonhos se realizassem.
Nesta noite Pedro dormiria no apartamento da família de Paulo. Por uma noite ele teria uma família.
As crianças estavam dormindo quando Isaias e sua esposa foram até a janela do quarto das crianças e pegaram os papeis escritos com os nomes do presente; na de Pedro estava escrito, uma família; na de Paulo, um irmão...
Para quem acredita em Papai Noel sabe que a história não termina aqui, pois embaixo da árvore estará, não importa qual o pedido, o presente. FELIZ NATAL!!